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Mostrando postagens de 2012

Reflexões sobre cérebro e consciência. Parte III

  Para a neurocientista e baronesa britânica Susan Greenfield, palestrante da conferência Fronteiras do Pensamento, de 22/09/2012, em Porto Alegre, com o tema o cérebro do futuro, o futuro do cérebro, “À medida que evolui, o cérebro humano consegue se libertar da tirania dos genes e se adaptar ao ambiente. A isso chamamos plasticidade, que vem do grego plastikos, que quer dizer ser moldado . Por cem mil anos, tempo em que o homem está no planeta, nenhum outro ser desenvolveu um cérebro como o seu”.     Professora da Universidade de Oxford, a neurocientista dedica-se ao estudo da fisiologia das doenças de Alzheimer e de Parkinson, além de trabalhar como divulgadora científica. A baronesa é voz dissonante na comunidade científica e fora dela; por defender que e ambiente virtual afeta de forma negativa o cérebro humano. Ela, inclusive, levou para o parlamento britânico, do qual faz parte; a discussão sobre a regulação do uso da internet e possíveis efeitos nocivos de seu uso so

Reflexões sobre cérebro e consciência. Parte II

A consciência é uma qualidade da mente. Abrange outras designações, tais como subjetividade, autoconsciência, sapiência, e a capacidade de perceber a relação entre si e um ambiente. É objeto de pesquisa no âmbito da ciência cognitiva e suas especialidades, médicas ou não, que vão desde a neurologia, a psicologia, a antropologia, passando pela filosofia da mente, além da inteligência artificial. Descobrir se estados mentais são estados cerebrais é dúvida antiga. O divisor de águas é o pensamento do filósofo e médico, Renè Descartes ao afirmar que estados mentais e estados cerebrais não são a mesma coisa. Ao defender a existência de um centro cerebral da consciência na glândula pineal e que, através dela, a alma se comunicaria com o soma (corpo), Descartes respondeu de forma original para o século XVII, à pergunta que sempre inquietou os humanos: — Quem somos nós? Três séculos depois, o filósofo da mente, Daniel Dennett contesta a validade da teoria de Descartes. Para Dennett

Reflexões sobre cérebro e consciência - Parte I

Reflexões sobre cérebro e consciência. Parte I. Consciência no sentido clássico é o estado em que a pessoa está ciente de suas ações físicas e mentais, só ocorrendo quando se está acordado e alerta. Por volta do século V a.C. o cérebro passou a ser reconhecido como o centro das atividades mentais, mas a idéia da existência de uma substância responsável pela formação da consciência, a dualidade herdada da antiguidade grega, persistiu. No século XVII, o filósofo e médico René Descartes, afirmou que a alma — mente — (e, por dedução a consciência) se dissociam do cérebro e do corpo. Somos uma mente que interage causalmente com um corpo e esse corpo se comporta como uma máquina. Essa alma não existe nos animais e nos autômatos (sim, Descartes imaginou os robôs). Possuímos comportamento reflexo; e, o cérebro é o local onde nossos pensamentos ocorrem. Estava criado o dualismo moderno, a doutrina segundo a qual mente e corpo são radicalmente distintos. Desde então dualistas e

Sobre o ato de escrever cartas

                     Escrever cartas hoje em dia é um ato totalmente anacrônico. Ninguém escreve estando próximo e a correspondência necessita da distância e da ausência para prosperar. Sendo este o motivo, tampouco se justifica a manutenção dessa forma de se comunicar. Basta uma tela de um celular para romper distâncias e uma tela de computador para visualizar o interlocutor do outro lado do mundo.             Aqueles poucos que insistem em escrever o fazem por saudosismo e pelo desejo que o destinatário responda também da forma epistolar. Ou seja, cartas assim, se tornam uma camisa de força para quem recebe. Algo parecido com duplicatas, que se recebe e se deve. Pode ser uma alegria receber uma carta, principalmente se for de um amigo. Contudo, o remorso em não respondê-la fica ali, perturbando-nos ao longo dos dias como uma dívida inadimplente, mandando a satisfação da notícia por água abaixo. Se a obrigação é apenas implícita, não há porque se magoar, já que carta não é jogo

Profissões que não escolhemos

            O filme “O primeiro ano do resto de nossas vidas”, de 1985, discute as incertezas de um grupo de jovens recém-formados em relação ao futuro profissional:                 “Quer saber qual a profissão ideal para você? Descubra algo que faria de graça para o resto da vida e ganhe dinheiro com isso” — diz um dos personagens, traduzindo o espírito dos anos oitenta, do qual os Steve Jobs e Bill Gates da vida são notórios representantes. Aparentemente um bordão como esse serve para relativizar tudo. Quando ao trabalho nos dá prazer, canalizamos para ele com uma vontade que beira o entretenimento; dedicação e disciplina, duas palavrinhas que, não raro, tem conotação de castigo para muitos de nós.             Viver da nossa vocação é uma tarefa arriscada. No auge da juventude, o que parece supérfluo e ambicioso a olhos alheios, para o obstinado é uma necessidade, orgânica até, que o faz concentrar-se no seu objetivo em si, sem que o foco da remuneração o persiga. Com o tempo, perc

Secura - Conto finalista do Sétimo Prêmio Maximiano Campos de Literatura - Antologia da Editora Carpe Diem - Recife-PE - www.editoracarpediem.com.br

            Sentada na carroceria do caminhão que a levaria à cidade, Ana findara a acomodação das tralhas, do embornal com galinha e jerimuns, enquanto Izabel, no outro braço, fuçava-lhe a teta ressequida; mais por achego que por leite. Dali, não saía nem uma gota. Tirou da trouxa um tiquinho de rapadura, amoleceu na língua, sentiu o gosto da doçura. Enfiou os dedos na boca, lambuzando-os no doce. Depois, melecou o bico do peito e o pôs entre os lábios da menina, que sugou com gosto.             Era época de chuva. Ana espichou o olhar pelo verde, parecido com sua rocinha. Feijão de corda, jerimum em ponto de comer, milho embonecando, um pouco de tudo, com destino certo: ela, três meninos, mais Izabel. Grudada no peito, a caçula tinha os olhos fixos na mãe. Ana sorriu. Uma menina, depois de anos sem filho. O marido voltou do garimpo, emprenhou-a e sumiu de novo.             Os moleques se fartavam, trepados nas grimpas; depois desciam de beiço rachado pelo sumo de manga deves. El

Chegadas e Partidas

Há trinta anos em dezenove de janeiro o Brasil perdeu a inesquecível “Pimentinha”. Em 1989, calou-se a voz de Nara Leão, a musa da bossa nova, coincidentemente nascida em um dezenove de janeiro. Em 2001, também em janeiro se foi Cássia Eller. Ninguém em sã consciência é louco de dizer que a Elis Regina ficou eternizada entre nós porque morreu cedo. Perto dos 40, linda e no auge da carreira, um furacão interior que não tinha tamanho e que não conseguiu domar. Convenhamos, ela estava na plenitude e daquilo que não é perene, se pudéssemos escolher, nos retiraríamos no auge. De comum entre essas três figuras femininas da música brasileira o fato de partirem ainda jovens, reconhecidas e amadas pelo público, o janeiro marcando suas vidas. Ao contrário de Nara Leão que faleceu em razão de uma doença, Cássia e Elis se foram de surpresa, gerando comoção nacional, deixando-nos a eterna pergunta: — Por quê? Junto com o ápice da nossa existência, de contrapeso, acumulam-se as dúvidas que nos