Existem diversos assuntos com os quais todos nós, em alguma medida, temos dificuldade de lidar. A lista é longa, mas se nos pedissem para reduzi-la a um mero item, creio que escolheríamos a dificuldade de lidar com a morte.
O máximo de avanço que conseguimos em relação à morte é um misto de medo ou fingida indiferença. Por mais firmes que sejam as nossas convicções _ na prática, são esboços de convencimentos para nos mesmos _ basta uma dor mais aguda que a habitual ou um nódulo mínimo apontado por uma ressonância magnética, para disparar o alarme. Temos pavor de morrer, ninguém está imune a esse sentimento. A tecnologia médica não nos serve nessa hora. A ciência pode nos dar respostas técnicas, mas não possui remédio que desate o nó que o horror da morte põe na nossa garganta. O que se quer mesmo é buscar sentido para a vida, uma explicação que nos atenue o medo de sermos apenas uma tabela periódica ambulante, como uma pedra a mais a vagar pelo cosmo. Essa dimensão espiritual, só é encontrada na crença religiosa, como nos diz o filósofo Luiz Felipe Pondé.
O consolo vem da fé em Deus. Com todo o respeito aos céticos, é melhor acreditar em Deus do que crer em uma bobagem qualquer, numa teoria materialista ou até acreditar em si próprio. Esse último, o máximo da vaidade, da confiança na nossa potência, do otimismo exacerbado, que nos distancia daqueles que julgamos mais fracos que nós.Qualquer alternativa ao Divino explica, explica, mas não nos justifica enquanto seres pensantes, perdidos num cantinho da via láctea. Mesmo admitindo a possibilidade de termos companhia no universo, gostamos de acalentar a esperança de sermos os únicos privilegiados com o mistério da vida inteligente e a ciência não nos basta. Ela não diminui a nossa solidão.
Estamos vivendo um momento em que a tecnologia se dispõe a prolongar a vida. Ela, contudo, não nos fará mais bondosos, mais compassivos com as mazelas alheias. O sofrimento físico, que de certa forma nos faz mais próximos, companheiros de jornada, uma vez controlado pela tecnologia, não extirpa outras espécies de padecimento. Nossas angústias, nossas dúvidas, continuarão dentro de nós em busca de um sentido que a fé nos dá.
Os progressos da humanidade dependem da crença, sim, mas também da nossa capacidade de realimentá-la, renová-la, de duvidar dela, até. A fé pode ser imutável. Nosso olhar atento, contudo, é imprescindível, a fim de que não voltemos a se apaixonar demais por nossas potências e nos desumanizemos sem perceber.
É Rackel, você tem razão: vivemos um tempo em que foi-nos retirada toda substância, ou melhor, em nome de uma racionalidade esmiuçamos tudo, colocamos sobre tudo a luz da nossa razão trôpega e matamos a magia, a pureza, o contato inocente com as coisas. Reiventarmos-nos é preciso, viver não é preciso!
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