É constrangedor admirar uma obra e não entender nada, ficar “devendo”. Isto é freqüente quando se trata de arte contemporânea. Dificilmente as expressões artísticas são entendidas no seu tempo. Nossos olhos e ouvidos precisam se acostumar com a vanguarda. Arte também é um mercado e precisa ser vendável. Assim como é igualmente complicado entender o mundo da alta costura, o paralelo pode ser aplicado às artes.
Nem tudo que se vê num desfile de modas é usável. É como se os estilistas colocassem um binóculo invertido. Ao invés de pessoas normais desfilando, o que vemos é uma explosão de fantasias unidas por um tema central, que definirá a tendência desta ou daquela estação. O que vai para as ruas é a inspiração daquela parafernália toda que inundou os olhos do mundinho fashion e de poucos privilegiados, ora pela grana, ora por ser o jogador namorado da modelo da hora. Pouquíssimos afortunados podem adquirir um modelo único. O que sustenta mesmo a máquina da moda é o pret-a-pôrter, a produção em série que vende em versões e releituras infinitas o que se firmar como moda na estação. É assim que passamos a pagar caro por calça rasgada, cintura baixíssima e se cobrir com cores como rosa e pink, mesmo que as detestemos. É moda, baby, relaxe. Não importa se o nosso manequim não é 36 e se a nossa coxa tem mais diâmetro que a cintura da modelo. Ai de nós se não arranjarmos um jeito de caber naquele número a menos.
Alguém poderia perguntar de que adianta tanto esforço investido para gerar o supérfluo, para não se construir... nada? É a mania do lado utilitário do conhecimento. Só valorizamos se for para dar forma ao concreto que satisfaz necessidades básicas. Comida, moradia, emprego e saúde não são suficientes para aplacar nossa ânsia. Prazer e lazer também caminham juntos e fazem parte do inevitável primordial, contribuindo para a harmonia das demais condições que cremos imprescindíveis.
O conceito de supérfluo versus básico, de dinheiro jogado fora, é relativo. Varia de pessoa para pessoas, é óbvio. Mas fazendo coro com a gritaria que rotula isto ou aquilo como desnecessário, só contribuímos para o desentendimento. Se não temos noção do todo é leviano julgar pelas partes.
O mundo das corridas de carro, que nos transparece sem muito sentido fora do círculo dos aficcionados, é um laboratório de tecnologias que algum tempo depois estão presentes no carro popular que roda nas ruas.
Atrás de cada supérfluo existe uma necessidade satisfeita. Essa energia que se chama dinheiro precisa ser movimentada para gerar sobrevivência, emprego, prazer e satisfação de nossas demandas. Não se aplica a tudo, naturalmente, mas é de se pensar um pouco mais antes de atirar a primeira pedra.
Moda não é uma perdição. É uma indústria que movimenta milhões vendendo sonhos e idéias, que sustentam pessoas, que trabalham ajudando a construir aqueles sonhos. É inevitável a disseminação das demandas que são criadas na ânsia do novo. No afã de sermos únicos vestimo-nos iguais. A vanguarda nos distingue e quando menos esperamos queremos o novo para nós. Assimilamos e aí não é mais supérfluo, é necessidade.
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