Pular para o conteúdo principal

FRAGILIDADE (ou experiências de solidariedade)



A angústia não é privilégio de poucos, a maioria a tem. Num maior ou menor grau ela nos avassala vez por outra insistindo em perturbar os dias e prejudicar a sanidade buscada. Nos dias atuais a palavra ansiedade revestida do aval científico veio dar outro nome à ancestral sensação de nó no peito que sentimos quando não conseguimos entender ou resolver algo a tempo e a hora ou quando os acontecimentos não tomam o rumo que esperávamos.
Sendo uma constante é inócuo ignorar a angústia. Racionalizar seria a melhor medida, mas não é assim que funciona na prática. A ansiedade extrema paralisa e não há como a pessoa tomar atitudes sadias diante dos obstáculos corriqueiros. Enfrentar a aflição além do caráter tem outras implicações que fogem à vontade. Quem mais opina sobre o problema dos outros, mais leigo é seu parecer, análise inconsciente das próprias atitudes e justificativa do modo de pensar de quem aconselha. Alguns ansiosos até tentam esconder a perturbação, mas o semblante deles não nega e percebe-se fácil quando estão tomados pela impotência em controlar os demônios internos.
É aí que tomamos consciência de quão efêmera é a existência e quão frágil é manter o equilíbrio. Na observação da desgraça alheia quem olha de fora tem a sensação de superioridade e potência. Pode-se tentar, mas não há isenção e é difícil não mergulhar no turbilhão de sensações de quem compartilha conosco o auge de uma crise de angústia. A empatia é necessária para se tentar ajudar. Mesmo de boca fechada socorremos e melhor, pois é o que o outro quer, vibramos na mesma energia, independente do esforço feito para olhar de forma distanciada quem sofre.
Sentimo-nos bem em sermos úteis e a pseudo-superioridade vem da constatação silenciosa: “alguém está pior que nós”. Mas não identificamos quanto custa compartilhar sentimentos alheios invadindo-nos por tabela quando nos prontificamos à solidariedade. Uma força momentânea se apossa de nós e podemos dissertar horas sobre o que poderia ou deveria ser feito. Mas a energia mobilizada em situações de conflito, mesmo o de terceiros, dá um desgaste danado. É energia que tiramos de nós para ajudar e que às vezes não a possuímos e buscamos força para emprestá-la a alguém? Daí a sensação vaidosa de ser melhor que o outro, pelo menos naquele momento.
As experiências de solidariedade nos retroalimentam e nos fazem perceber a existência de diversos níveis de fragilidade. Nosso equilíbrio é momentâneo e só podemos afirmar sua existência na vivência de cada minuto. Daqui a pouquinho não garantimos mais. É outra batalha. Como nas regras ao se livrar de um vício: “só por hoje não fumo mais”. Não adianta fazer planos para um futuro distante. Para um horizonte incerto não se traça planos, se estabelece objetivos. Os planos se refazem minuto a minuto, na perseverança daquilo que se quer. O equilíbrio se mantém quando se faz presente em cada momento da vida.
Somos todos frágeis, apenas alguns de nós estão num nível de vigor maior e aí pode ajudar quem está do lado a reerguer-se. Perceber estes momentos ajuda a crescer. Disponibilizar-se sem interferir ou julgar é o desafio que vai determinar o sucesso da nossa ajuda e nos fortalecer de volta. Depende do estado de alerta da nossa percepção. Mas não custa tentar. Só não vale desperdiçar oportunidades.

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

A métrica no poema e como metrificar os versos de um poema.

Texto publicado no site Autores.com.br em 25 de Novembro de 2009 Literatura - Dicas para novos autores Autor: PauloLeandroValoto "Alguns colegas me abordam querendo saber como faço para escrever e metrificar os versos de alguns de meus poemas. Diante desta solicitação de alguns colegas aqui do site, venho explicar qual a técnica em que utilizo para escrever poemas com versos metrificados. Muitos me abordam querendo saber: - Como faço? - Como é isso? - O que é métrica? - Como metrifico os versos de meus poemas? - Quero fazer um tambem. - Me explique como fazer. Vou descrever então de uma forma simples e objetiva a técnica que utilizo para escrever poemas metrificados. Primeiro vamos falar de métrica e depois vamos falar de como metrificar os versos de um poema. - A métrica no poema: Métrica é a medida do verso. Metrificação é o estudo da medida de cada verso. É a contagem das sílabas poéticas e as suas sonoridades onde as vogais, sem acentos tônicos, se unem uma com as outras fo

Jogo de Palavras

Dizer que foi o receptor da comunicação quem se equivocou é uma atitude cômoda para o emissor, porém arriscada, já que a conversa pode se encerrar por ali. Quando lançamos mão do tradicional “você é que não me entendeu”, estamos transferindo para o outro a responsabilidade pelo equívoco que nós mesmos provocamos. Na prática, a nossa atitude em si é arrogante, pois não admite a possibilidade de erro e ainda por cima se exime das conseqüências, como se fôssemos donos da verdade e só a nossa versão é que contasse. Seria muito mais humilde e receptivo trocar a mensagem por “eu não me fiz entender”. Acalma o interlocutor e de quebra nos dá fôlego para uma segunda chance. Ocorre que na maioria das vezes nos utilizamos dessa tática com a melhor das intenções e com o honesto propósito de esclarecer a idéia que queríamos transmitir. Como a resposta vem de imediato à nossa mente, estamos convictos que esta forma de se expressar é correta e tanto cremos nisso que a reação é automática e não enten

A arte de escrever Sonetos

Texto de Paola Rhoden, publicado no site Autores.com em 05 de novembro de 2009 Em primeiro lugar, não se ensina um poeta a escrever. Ele tira da alma o que sua mão escreve. Porém, a tarefa de escrever um soneto, uma obra considerada pelos intelectuais de símbolo da poesia, não é fácil. Não é fácil porque aqueles que cultuam essa técnica, não arredam pé de que é essencial para um soneto seguir as regras. Mas, para quem gosta e quer seguir por esta árdua estrada, abaixo seguem algumas delas: Um soneto é uma obra curta que transmite uma idéia completa. Para se escrever um soneto perfeito, ou clássico, como é chamado pelos profissionais de literatura, deve seguir as regras mundialmente utilizadas, que são: métrica, ritmo e rima. Um soneto clássico é formado por quatorze (14) versos decassílabos, dispostos em quatro estrofes, da seguinte maneira: a) dois quartetos ( ou quadras ); b) dois tercetos ( ou terças); c) a métrica deve seguir as normas. Cada um dos 14 versos deve ser decassíla